Antiga questão republicana novamente em debate: as relações e o equilíbrio entre Poderes, as competências e limites de cada um deles. O Império recebia influência europeia, a República de 1889 modelou-se pelos Estados Unidos do ponto de vista institucional e no ideário de seus instituidores.
Os norte-americanos, na independência, optaram pela república e uma nova forma de governo, o presidencialismo. Ao se vincularem à teoria de Montesquieu, dos "três poderes" (Executivo, Legislativo e Judiciário), acautelaram-se de que nenhum deles pudesse virar um superpoder e se impor aos demais, cometendo abusos sobre a cidadania. Trataram de estruturar "equipotência" entre eles para que se contivessem em benefício e proteção ao cidadão. Pode-se dizer que funcionou por lá - os Estados Unidos, em mais de 200 anos, nunca tiveram uma ditadura... Todavia, os países que se inspiraram neles, em geral, oportunizaram distorções e possibilitaram experiências autoritárias: a América Latina tem uma história recheada de ditaduras e exageros presidencialistas.
Ao redigirem a Constituição de 1988, os constituintes brasileiros buscaram organização institucional que alcançasse a dita "equipotência", preconizada pelos instituidores do presidencialismo. Por aqui também se procurou que os três poderes sejam igualmente fortes e os cidadãos estejam protegidos de abusos autoritários. É nesse enfoque que devemos observar e refletir sobre crises e agendas atuais. Por vezes, a opinião pública tem dificuldades em absorver certos episódios, porque há toda uma herança de longa trajetória anterior na qual o governante eleito (presidente, governador ou prefeito) era considerado o chefe dos demais, o poderoso, permitindo-se abusar da autoridade.
Entre os mecanismos para um poder controlar o outro, a Constituição atribuiu ao Congresso Nacional a competência de "sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa". Trata-se de remédio para a prática dos governantes extrapolarem seus poderes e substituírem o papel específico dos legisladores. Em episódio recente, o Congresso reagiu contra decreto que atribuía a autoridades de médio escalão a possibilidade de decretar sigilo de documentos, contrariando a legislação de transparência na administração pública e publicidade de seus atos. O mesmo aconteceu em relação ao polêmico decreto sobre posse e porte de armas.
Se olharmos para o presidencialismo norte-americano, veremos um Congresso muito forte, a Suprema Corte igualmente e acumulando a cúpula do Judiciário com o controle da constitucionalidade de leis e atos e nem por isso pode-se dizer que a presidência daquele país tenha pouca autoridade ou seja fraca institucionalmente. É a tal de "equipotência". Todos fortes e se autocontrolando em benefício do cidadão. É o que estamos intentando no Brasil desde a Constituição de 1988 e é tema sensível neste momento